quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Retrospectiva 2007 - Mudanças climáticas: o mundo, enfim, acorda para o problema

     O ano de 2007 foi marcado por discussões sobre os efeitos do aquecimento global. Em quatro relatórios, o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, em inglês) da Organização das Nações Unidas (ONU) diagnosticou efeitos do fenômeno que já acontecem. A primeira parte do Relatório, divulgada em fevereiro, mostrou que a ação do homem é responsável pelo aquecimento global. O aumento do uso de combustíveis fósseis e a conseqüente liberação de gases causadores do efeito estufa, como dióxido de carbono, é fator decisivo no aumento da temperatura planetária.
     Os cientistas alertam que a temperatura da Terra, até o final do século, pode subir de 1,8ºC a 4ºC. O derretimento das camadas polares deve fazer com que os oceanos se elevem entre 18 cm e 58 cm até 2100, forçando que populações se mudem das regiões costeiras. Além disso, tufões e secas devem se tornar mais intensos.
     Em abril, o IPCC mostrou que as secas e a falta de água afetariam, a partir de 2020, mais de 1 bilhão de pessoas. As regiões mais vulneráveis às ações das mudanças climáticas são o Ártico, a África subsaariana – composta por 47 países -, as pequenas ilhas, e os deltas asiáticos. Se no primeiro relatório foi considerado um aumento possível de 4ºC, este segundo analisou que um terço das espécies de flora e fauna do planeta podem ser extintos com a elevação da temperatura global acima de 1,5ºC em relação aos índices de 1990. A agropecuária também será afetada, principalmente nos continentes africano e asiático. Milhares de pessoas devem ser afetadas pela fome e por doenças. Um efeito mais presente aos brasileiros é a savanização da Amazônia.
     O terceiro relatório, que criou hipóteses para calcular os custos das mudanças climáticas, traz a recomendação dos especialistas de estabilizar a emissão de gases que causam o efeito estufa até 2030, e reduzi-la até 2050. Neste contexto, o relatório destaca a importância de medidas como a adoção de energias limpas e de biocombustíveis, como o etanol brasileiro. Segundo o relatório, todo esse esforço pode ser feito a um custo anual de não mais que 3% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial até 2030. O relatório também menciona que cada pessoa, individualmente, pode contribuir para a diminuição das emissões de gases poluentes apenas mudando seu estilo de vida.
     A quarta e última parte, divulgada em novembro, exige que as autoridades mundiais realizem o mais rápido possível ações multilaterais para enfrentar o problema das mudanças climáticas, já que a situação tem base científica e seus efeitos em todo o planeta foram comprovados. Os cientistas alertaram que se medidas urgentes não forem tomadas, os efeitos do aquecimento global serão irreversíveis. 
     Por falta de dados, o Brasil quase não foi citado no relatório e, apenas na última hora, a Amazônia mereceu uma menção. Por iniciativa brasileira, incluiu-se um quadro apresentando exemplos de regiões que podem ser afetadas pela mudança climática em todo o mundo, entre as quais estão a Amazônia e o semi-árido nordestino.
     Para Jim Hansen, diretor do instituto para estudos do espaço da Nasa - a agência espacial americana -, a situação pode chegar a um ponto irreversível (Leia em Aquecimento global pode ser irreversível em 10 anos).
     Mesmo com todos os estudos sobre as mudanças climáticas, ainda há aqueles que desconfiam desse cenário, considerando-o catastrófico demais. Esses cientistas, chamados genericamente de céticos, acreditam que a ação humana não é maior responsável pelo aquecimento global e que não há como frear a emissão de dióxido de carbono nas próximas décadas. Para eles, ao contrário do IPCC, os efeitos do aquecimento global só serão perceptíveis entre 50 e 100 anos e as catástrofes naturais serão raras.
     Para Luiz Carlos Molion, pesquisador especialista em clima da Universidade Federal de Alagoas, o homem, por meio das emissões de gases causadores do efeito-estufa, pode não ser o culpado pelo aquecimento global (Leia em  Pesquisador nega aquecimento global causado por efeito-estufa).
 
     Efeitos
     Independentemente da opinião do IPCC ou a dos chamados cientistas céticos, alguns impactos da mudança climática já podem ser notados sobre a fauna e sobre a flora. Estudo publicado na revista "Science" mostrou que recifes de coral do planeta estão ameaçados e correm sérios riscos se o nível de dióxido de carbono na atmosfera e a acidez das águas oceânicas continuarem aumentando no atual ritmo. Os altos índices de acidez dissolvem minerais na água necessários para a calcificação dos corais, determinando sua morte prematura.
     Já outro estudo, publicado no livro Handbook of European Freshwater Fishes (Guia dos Peixes de Água Doce da Europa), alertou que um terço do total das espécies de peixes da Europa está sob ameaça de extinção. As secas de lagos e rios, que têm sido freqüentes durante os meses de verão por causa do aquecimento global, já levaram à extinção de algumas espécies migratórias, aponta o estudo.
     Temperaturas elevadas, em junho, no sudeste da Europa, prejudicaram a vida selvagem e as plantações. Na Itália, as frutas amadureceram semanas antes do esperado. Na Grécia, ambientalistas advertiram para o perigo de as altas temperaturas terem um impacto de longo prazo sobre as populações de animais e plantas do país. As andorinhas enfrentaram dificuldades para encontrar a lama utilizada na fabricação de seus ninhos, vendo-se obrigadas a viajar distâncias maiores para obter o material. Os sapos, rãs e salamandras depararam-se com o sumiço de seus habitats, que estão secando. Isso não afeta apenas esses animais, mas também as espécies que se alimentam deles.
     Incêndios florestais devastaram milhares de hectares na Europa e na Califórnia (EUA), obrigando o deslocamento de milhares de pessoas e animais e a morte de milhares de espécies da flora. No Brasil, os incêndios em unidades de conservação também foram freqüentes.
 
     Tragédias ambientais
     A temporada de tempestades começou três semanas mais cedo e deixou um rastro de destruição na América Central, no Caribe e no México.
Catorze tempestades tropicais e seis furacões se formaram no Atlântico. A primeira, uma tempestade tropical chamada Andréa, atingiu ventos máximos sustentados de 72 km/h, mas logo perdeu força ao avançar para o sul. O primeiro furacão, Dean, se formou em agosto e matou 22 pessoas no México, Haiti, Jamaica e outras partes da região do Caribe. Em setembro, o furacão Félix chegou à categoria 5, a máxima, na escala de Saffir-Simpson, deixando 146 mortos, 188 mil desabrigados e 19 mil casas total ou parcialmente destruídas na Nicarágua.
     No mesmo mês, o furacão Humberto atingiu os Estados Unidos.
O Lorenzo, de categoria 1, atingiu o litoral do Golfo do México. Em novembro, as chuvas provocadas pelo furacão Noel causaram enchentes e deslizamentos de terra no Caribe, matando 118 pessoas, sendo o mais letal da temporada. Em dezembro, o Caribe foi castigado pela tempestade fora de época Olga, que matou 22 pessoas.
     O ciclone Sidr atingiu Bangladesh em novembro com ventos de 250 quilômetros por hora. O ciclone vitimou mais de 3.000 pessoas, arrasou 187 mil hectares de plantações e destruiu total ou parcialmente 1,2 milhão de casas.
 
     Pós-Kyoto
     De 03 a 14 de dezembro, foi realizada em Bali, na Indonésia, a conferência da ONU sobre mudanças climáticas. Apenas no dia 15 os países participantes assinaram o documento final que, com algumas concessões, reconhece que os países pobres e em vias de desenvolvimento precisam de financiamento das nações ricas para enfrentar os desastres naturais e efeitos negativos do aquecimento do planeta; se compromete a impulsionar os programas de transferência de tecnologia para que os países emergentes possam se adaptar à mudança climática e minimizar seus efeitos; ajudas às nações em vias de desenvolvimento serão concedidas para conservação e proteção de suas florestas; reconhece a "necessidade urgente" de agir para reduzir as emissões de carbono provenientes do desmatamento.
     Um dos pontos mais difíceis e importantes foi o reconhecimento de que o último relatório do IPCC da ONU é o estudo científico mais completo e o documento de referência sobre o aquecimento global. Esta aceitação fez com que os Estados Unidos admitissem a importância de que as emissões de gases poluentes dos países industrializados diminuam entre 25% e 40% - em relação aos níveis de 1990 - até 2020.
 
     Nobel da Paz
     O Prêmio Nobel da Paz 2007 foi concedido ao ex-vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore, e ao Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU.
     O Comitê Nobel considerou os esforços dos vencedores na luta contra a mudança climática como um dos fatores que podem ameaçar "as condições de vida de grande parte da humanidade", pois originariam, entre outras coisas, "migrações em grande escala, uma maior concorrência pelos recursos naturais e conflitos violentos entre países".
     Al Gore também foi o vencedor do Oscar de melhor documentário por Uma Verdade Inconveniente.
     Seguindo os passos de Gore, o ator hollywoodiano Leonardo di Caprio, galã desde "Titanic", também se engajou na luta contra o aquecimento global. Ele produziu e narra o documentário "A Última Hora", que mostra depoimentos de personalidades e ambientalistas, ilustrados por imagens dos efeitos causados pelas mudanças climáticas (Leia mais na matéria EXCLUSIVO: No documentário de Leonardo Di Caprio sobre aquecimento global, o que vale é a boa intenção).
 
Autora: Neide Campos - AmbienteBrasil


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