domingo, 18 de março de 2007

Mudanças Climáticas

Atento aos estudos sobre os impactos das mudanças climáticas globais, o geógrafo Aziz Ab'Sáber, 83, concorda com a tese de que o homem está aquecendo o planeta. Mas, quando o assunto é o impacto da nova realidade climática nos biomas brasileiros, a tese do pesquisador contraria as previsões recentes dos cientistas. "A tendência no caso das matas atlânticas e da Amazônia é que elas cresçam e não que sejam reduzidas", disse o pesquisador, em entrevista à Folha.
Para ele, a região conhecida como mata atlântica na verdade é formada por três biomas: as matas, o planalto das araucárias e as pradarias mistas, que ocorrem apenas no Sul. O geógrafo afirma ser impossível o fato de um estudo apresentado no Rio de Janeiro no início da semana ter previsto que o aquecimento global poderá reduzir em até 60% a mata atlântica brasileira. Para Ab'Sáber, muitos cientistas estão esquecendo de considerar as correntes marítimas brasileiras. "Elas vão continuar mais ou menos como hoje." Se isso ocorrer, explica Ab'Sáber, o chamado ótimo climático, registrado entre 5.000 e 6.000 anos atrás, vai se repetir, não de causa natural, mas por causa antrópica. "Quem não conhece o conceito de ótimo climático vai inverter a situação. Há 6.000 anos, a umidade mais alta nos mares foi fundamental para manter as florestas atlânticas."
Para Ab"Sáber, as causas que permitiram a "retropicalizaçã o" do Brasil depois do último período de glaciação serão apenas reforçadas agora. "As correntes marítimas de água quente, na atualidade, migram até o sul do Brasil a partir da região equatorial. Desconsiderar isso implica errar tudo". Além disso, segundo o geógrafo, é preciso que as pessoas "leiam o passado". Principalmente no intervalo de tempo que começou há 11 mil anos. "É preciso saber que, quando o mar esteve 95 metros mais baixo do que é hoje, no último período de glaciação, a corrente fria que nós chamamos das Malvinas (ou de Falklands também, para não brigar com os cartógrafos), vinha até além da Bahia. Ela não deixava passar os ventos úmidos para dentro do continente. Climas frios se estabeleceram. Ela era uma barragem para penetração de ventos marítimos", ressalta. Segundo Ab'Sáber, o fenômeno era a semelhante ao que ocorre hoje na costa do Pacífico, entre o Chile e o Peru. "Lá a corrente é fria e toda a região costeira é semidesértica. "
Com o aumento do nível do mar -entre 5.000 e 6.000 anos ele esteve três metros acima do que está hoje-, a corrente quente chegou ao sul do Brasil, onde ainda está hoje. "Ela levou consigo uma umidade que permitiu a formação de florestas costeiras até perto de Porto Alegre, que seguiu depois pela serra Gaúcha desde a cidade de Taquara até além da cidade de Santa Maria."
No caso da Amazônia, principalmente na região oriental, as previsões dos cientistas, segundo o professor da USP, também estão erradas. "Todos falaram que a floresta vai diminuir e ganhar cerrado. O aquecimento global não vai destruir floresta. No máximo, vai haver uma nova delimitação nos bordos da Amazônia. Novos minibiomas vão entrar, até pode ser o cerrado. É certo que vamos continuar com grandes florestas a oeste, porque o regime de chuvas não será muito alterado." Uma concordância com a maior parte dos estudos. Para o geógrafo da USP é realmente preciso ter cuidado com as zonas litorâneas, porque o mar de fato vai subir.

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Impactos da mudança do clima associado ao desmatamento da Amazônia

Hipótese é de que o aumento do desmatamento e da concentração
de gases do efeito estufa possa mudar o clima da Amazônia e afetar
sensivelmente o transporte de umidade para a Bacia do Prata

Especialistas em meteorologia, ligados ao Programa LBA e a outros projetos internacionais de pesquisa, têm agora fortes razões para acreditar que a mudança de clima, em conseqüência do desmatamento amazônico esteja afetando o regime de chuvas em toda a América do Sul, inclusive na Bacia do Prata. A fumaça das queimadas também estaria alcançando o sul do continente.
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Os indícios vieram com a execução da etapa brasileira do projeto SALLJEX (SouthAmerican Low-Level Jet Experiment). Entre dezembro de 2002 e fevereiro de 2003, pesquisadores lançaram cerca de 700 balões parecidos com os de festas infantis no céu da Amazônia. Alguns balões carregavam sensores para medir pressão atmosférica, temperatura, umidade do ar e velocidade dos ventos.
Os resultados - registrados no Brasil, na Bolívia, na Argentina e no Paraguai por 50 pesquisadores brasileiros, bolivianos, argentinos, paraguaios, uruguaios, chilenos, peruanos e norte-americanos - mostraram as trajetórias e as características dos chamados "jatos de baixos níveis" da América do Sul.
Segundo o professor José Antonio Marengo Orsini, do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e coordenador do trabalho, os jatos podem ser comparados a "rios voadores" que carregam umidade do norte para o sul do continente. Localizam-se nas camadas mais baixas da atmosfera (até 3 quilômetros de altura) e deslocam-se com velocidades de até 50 quilômetros por hora.
Identificados na década de 1960 (vide Box abaixo), os jatos de baixos níveis são formados pelos ventos alísios do oceano Atlântico, que invadem o território brasileiro pela ponta nordeste da Amazônia.
Sobre a Amazônia os jatos absorvem muito vapor d'água, liberado pelas folhas da floresta por meio da transpiração. Ao chegarem à fronteira do Acre com a Bolívia encontram a cordilheira dos Andes, que funciona como um acelerador e uma barreira: desvia os jatos para o sul e, ao mesmo tempo, aumenta sua velocidade.
Os jatos seguem então sobre os estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e São Paulo mas, ao atingirem a bacia do Prata, interagem com o relevo e com frentes frias nascidas no pólo Sul, formando enormes nuvens conhecidas por Complexos Convectivos de Mesoescala. Estas formações são muito espessas, atingem 18 quilômetros de altitude e mil quilômetros de diâmetro, e têm um ciclo de vida de até 36 horas. Surgindo em geral durante a noite, são responsáveis por tempestades, raios e relâmpagos, no sul do país e no norte da Argentina e do Paraguai, em especial no verão.
Pode-se dizer, grosso modo, que quando começa a ventar forte na Amazônia vai chover muito para os lados do Sul. Há uma relação direta entre os jatos que, a partir da Região Norte cruzam o país rumo ao sul, a leste dos Andes, e as chuvas que caem na bacia do Prata, vasta área que, além de São Paulo e dos estados sulinos, abrange o Uruguai e o norte da Argentina e do Paraguai.
Infelizmente os jatos de baixos níveis quase não apareciam nos boletins do tempo, pois existem poucas estações de observação na Região Norte do país (a Organização Meteorológica Mundial recomenda uma estação a cada 500 quilômetros, mas na Amazônia a distância pode chegar a mil quilômetros). Com menos registros de jatos torna-se mais difícil a previsão de tempestades no Prata. Após o experimento de campo SALLJEX os jatos de baixos níveis passaram a ser mencionados nas previsões, especialmente no verão e na primavera, associados a intensas chuvas no sul do Brasil e norte da Argentina.
Os jatos como vetores de fumaça
Mas os jatos que trazem chuvas podem, no entanto, transportar componentes bem mais nocivos do que água como, por exemplo, a fumaça das queimadas amazônicas. Indícios desse fenômeno já foram relatados em artigos científicos do professor Marengo em revistas como a Climate Dynamics, o Journal of Geophysical Research, a Revista Brasileira de Meteorologia e o Journal of Climate.
Os cientistas temem que o aumento do desmatamento reduza os volumes de vapor d'água que a vegetação da Amazônia libera na atmosfera em tão alta escala que chegue a afetar o transporte de umidade para a bacia do Prata pelos jatos de baixos níveis. Isso teria reflexo direto sobre as estações chuvosas, embora ainda não haja como quantificar essa mudança.
Só no "ano agrícola" de 2003-2004, foram desmatados 26.130 quilômetros quadrados da Floresta Amazônica, o segundo maior índice da série histórica, criada em 1988. Em outras palavras: o equivalente a um estado de Alagoas virou fumaça. Em queimadas desse porte grandes volumes de gases, como monóxido de carbono e ozônio, são liberados na atmosfera, a ponto de tornar o clima mais seco e as temperaturas mais altas.
Com os jatos de baixos níveis, poeira e gases de queimadas amazônicas podem atingir mesmo quem vive no Sul ou Sudeste do país e até em países vizinhos. A emissão de fumaça é local, mas o impacto é global. Além disso, os gases das queimadas disputam com o vapor d'água o transporte nos jatos, que se tornam menos caudalosos.
Indícios preocupantes
Os dados disponíveis mostram que as possíveis alterações no clima da Região Sul podem ser significativas. Segundo o INPE, em 2002 (janeiro) a quantidade média de chuvas nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina era de 100 a 150 milímetros. Em 2003 a média foi mantida, mas numa longa faixa no sul gaúcho o índice caiu para 50-100 milímetros. No ano seguinte, os dois estados registraram chuvas totais de 50-100 milímetros no período, e no noroeste gaúcho o volume não passou de 25-50 milímetros.
Em anos posteriores a situação melhorou, mesmo porque os jatos de baixos níveis não são os únicos responsáveis pelas chuvas, associadas também às massas de ar frio do pólo Sul, às correntes marítimas, e ao fenômeno meteorológico El Niño. Mas a redução não deixou de ser preocupante.
De fato a economia da bacia do Prata depende da agricultura e da pecuária, ou seja, de chuva. Entre 2004 e 2005 a safra da Região Sul caiu de cerca 49 para 45 milhões de toneladas. Teme-se que entre as causas, além da variabilidade natural do clima, estejam as queimadas da Amazônia, já que a área cultivada manteve-se estável.
As variações do regime de chuvas pedem o aprofundamento dos estudos sobre os jatos de baixos níveis. Para o professor Marengo, esse trabalho ajudaria a estimar impactos do desmatamento da Floresta Amazônica sobre o clima no sul da América Latina, além de melhorar a previsão do tempo nessas áreas.

Os jatos de baixos níveis
O transporte de umidade por jatos de baixos níveis começou a ser estudado há 40 anos, quando o norte-americano William Bonner relacionou os jatos do golfo do México ao clima úmido das planícies centrais dos Estados Unidos. Pouco depois o alemão Gordon Gutman, que vivia na Argentina, identificou ventos semelhantes deslocando-se ao longo dos Andes. Finalmente o tanzaniano Hassan Virji, radicado nos Estados Unidos, demonstrou a existência dos jatos também na América do Sul, no início dos anos 80.
Numa experiência comprovatória, iniciada em 19 de janeiro de 2003, em Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia, um avião americano da National Oceanic and Atmospheric Administration e balões de coleta de dados detectaram jatos de baixos níveis em quantidade elevada, deslocando-se a cerca de 40 quilômetros por hora. No dia seguinte estavam a 50 km/h. Um dia depois enormes nuvens cobriam os céus da Argentina e do Paraguai - eram os Complexos Convectivos de Mesoescala. Fortes tempestades atingiram os dois países nos dias 22 e 23 de janeiro. Todo o processo foi registrado, desde a Amazônia até a Bacia do Prata.
O SALLJEX (SouthAmerican Low-Level Jet Experiment) faz parte do Programa Internacional de Variabilidade do Sistema de Monção da América (VAMOS, Variability of American Monsoon System), financiado pelo Programa Internacional de Variabilidade e Previsibilidade de Clima (CLIVAR, Climate Variability and Predictability), associado à Organização Meteorológica Mundial.

Professor Doutor José Antonio Marengo Orsini
Especialidade: Meteorologia. Atua na área de variabilidade e mudanças climáticas.
Site: http://lba.cptec.inpe.br/lba/site/?p=jatos&t=0

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