Potencial da biodiversidade brasileira para desenvolvimento de fármacos é pouco explorado
O Brasil abriga centenas de milhares de espécies de plantas, animais e microrganismos. Mas essa diversidade biológica, apesar do enorme potencial, não é aproveitada para o desenvolvimento de novos medicamentos. Em simpósio durante a reunião anual da SBPC, cientistas da área defenderam o investimento em pesquisas para buscar a identificação de princípios ativos que atuem seletivamente em alvos terapêuticos específicos, com o objetivo de agregar valor a componentes da biodiversidade brasileira.
Entre as oportunidades de pesquisa na área, Carlos Amilcar Parada, do Departamento de Farmacologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (USP), destaca a busca, em especial no extenso banco genético da Amazônia, de uma molécula capaz de bloquear, sem afetar outras regiões do organismo, a ação dos chamados canais de sódio. Essas estruturas, presentes nos neurônios do sistema nervoso periférico, estão associadas à presença da dor.
Pesquisadores brasileiros esperam encontrar na fabulosa riqueza genética da biodiversidade amazônica moléculas capazes de agir contra a dor inflamatória e outros males (foto: Cesar Paes Barreto).
"Esse é um importante alvo terapêutico", diz Parada. "Cerca de 61,3% dos adultos entre 18 e 60 anos sofrem de dor." Mas, segundo o pesquisador, os analgésicos existentes atualmente agem contra a dor global e acabam gerando reações indesejadas no organismo.
Parada lamenta que, apesar da nossa vasta biodiversidade, nos faltam processos para identificar os princípios ativos adequados. Segundo ele, estudos preliminares realizados por pesquisadores estrangeiros mostraram que uma toxina extraída de um crustáceo marítimo pode ter esse efeito bloqueador dos canais de sódio. "Com tudo o que temos, essa molécula foi identificada em outro país."
Atenção às plantas medicinais
O pesquisador ressalta a importância de se investir no estudo dos componentes biológicos das plantas medicinais já usadas pela população, pois os medicamentos derivados dessas plantas têm um custo menor do que os sintéticos e são mais aceitos pela população de baixa renda. "Um estudo da Unifesp [Universidade Federal de São Paulo] com 146 espécies vegetais nativas usadas por uma tribo indígena para fins medicinais mostrou que 138 delas parecem ter algum tipo de influência sobre o sistema nervoso central", exemplificou.
O pesquisador ressalta a importância de se investir no estudo dos componentes biológicos das plantas medicinais já usadas pela população, pois os medicamentos derivados dessas plantas têm um custo menor do que os sintéticos e são mais aceitos pela população de baixa renda. "Um estudo da Unifesp [Universidade Federal de São Paulo] com 146 espécies vegetais nativas usadas por uma tribo indígena para fins medicinais mostrou que 138 delas parecem ter algum tipo de influência sobre o sistema nervoso central", exemplificou.
Mas é preciso cautela nos estudos com plantas medicinais selvagens. O engenheiro agrônomo Ílio Montanari Jr., do Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas da Universidade Estadual de Campinas, explica que uma mesma espécie pode apresentar variações genéticas que causem alterações em suas propriedades químicas.
"No desenvolvimento de medicamentos, é preciso levar em conta essa variabilidade, para não se produzir toneladas de um produto que não terá o efeito desejado", alerta. Ele destaca a importância de manter o padrão da matéria-prima usada na produção de medicamentos, o que seria mais fácil a partir do uso de plantas cultivadas.
O farmacologista Sergio Henrique Ferreira, do Departamento de Farmacologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, afirma que a biodiversidade brasileira é uma grande fonte de matéria-prima para o desenvolvimento de fármacos. "Mas não bastam insumos e vontade de pesquisar, se não investirmos em ciência básica e tecnologia para a identificação de alvos terapêuticos e o desenvolvimento de medicamentos", argumenta, ressaltando ainda a necessidade de elaboração de políticas de proteção de mercado para que as inovações não sejam absorvidas por conglomerados internacionais.
Autor: Thaís Fernandes - Ciência Hoje On-line
Disponível em: http://ich.unito.com.br/96278
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