segunda-feira, 24 de agosto de 2009

"O que se faz hoje no RS está longe de ser uma política ambiental"


O ambientalista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Paulo Brack, avalia os 10 anos da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema) e a falta de política ambiental que contribua com o desenvolvimento do Estado.

     Porto Alegre (RS) - A Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema) completa 10 anos de criação neste ano de 2009. A data já foi lembrada pelo governo estadual com algumas atividades, sem muita pompa e com pouquíssimos festejos. O ambientalista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Paulo Brack, avalia que não há muito o que comemorar.
     Na entrevista a seguir, Brack comenta o desmonte da secretaria e a falta de uma política ambiental para o Rio Grande do Sul que preserve a biodiversidade e estimule o desenvolvimento local. Temas que deveriam ser tratados justamente pela Sema.

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Brack em reunião do Consema

Completados dez anos da Sema, há o que comemorar? A comemoração seria o surgimento da secretaria em 1999. No início, ela até teve uma proposta e uma estabilidade porque nos três primeiros anos teve um só secretário. A partir daí, as mudanças foram praticamente anuais. Temos entre 10 e 11 secretários desde o seu surgimento. Mas eu diria que a secretaria não foi implementada da maneira que deveria acontecer. Primeiro que quando ela surgiu, deveria ter tido uma estrutura de concursos para várias áreas, até mesmo para preencher lacunas que tivemos com o PDV entre 1996/1997 durante o governo de Antônio Britto. Naquela época ainda não havia secretaria, mas a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) sim, e dela muitos técnicos foram estimulados a sair. E muitos ainda continuam saindo da secretaria. Houve alguns concursos, mas o salário é muito baixo. O Departamento Estadual de Florestas e Áreas Protegidas (Defap), que é uma área estratégica para a biodiversidade, também não teve o devido concurso e agora esta área está desfalcada. E é uma área muito estratégica para a conservação da biodiversidade, fiscalização e controle do desmatamento, para as licenças. E hoje a Fepam está sob a direção da Ana Pellini, que já demonstrou que entrou como uma interventora nomeada pela governadora para substituir outros diretores que tinham uma certa trajetória [no órgão]. Ana Pellini não tinha nenhuma trajetória, ela veio da Secretaria de Segurança Pública.

Qual é a sua opinião sobre a política atual da secretaria? Hoje nós estamos vendo um retrocesso imenso na Secretaria do Meio Ambiente. A inconstância política significa que a não-existência de uma política ambiental seja uma política. Ela corresponde a uma concepção que simplesmente a Sema tem que servir para liberar tudo que é tipo de obra. Quando se trata de obras do governo eles dão um jeito de dar licença e isso demonstra que temos pessoas com o intuito principal de licenciar obras custe o que custar - inclusive desrespeitando a lei, como a emissão de licenças-prévias sem estudo de impacto ambiental. Isso aconteceu em várias obras, inclusive nas barragens Jaguari e Taquarembó, no Rio Santa Maria, as grandes barragens do PAC [Programa de Aceleração do Crescimento] na Metade Sul. E que depois inclusive se descobriu irregularidades com empreiteiras e com o secretário de Irrigação, Rogério Porto. Essa pressa em dar licença algumas vezes ela também está ligada a fatos de irregularidades e de tráfico de influência. Infelizmente acontece isso. A questão das papeleiras aqui no Estado também foi emblemática. Elas [empresas] conseguiram desconstituir o zoneamento da silvicultura, que foi um estudo muito importante. Esse trabalho, por força das empresas de celulose, que queriam plantar mais de um milhão de hectares, não foi implementado como deveria. Infelizmente, a visão na Sema é uma visão imediatista, que despreza a conservação ambiental, não tem nenhuma visão estratégica que inclua a biodiversidade como elemento fundamental hoje para o Brasil. Nós somos um país megadiverso campeão da biodiversidade no mundo. E estamos destruindo tudo isso. Talvez o RS seja um dos estados que mais desrespeita a biodiversidade.

A municipalização das licenças ambientais é um avanço? A municipalização e a descentralização da área ambiental sem ter marco regulatório e com a estrutura mínima das prefeituras - e hoje a gente sabe que os municípios não têm condições – não é a saída. Eles estão terceirizando o trabalho de licenciamento. Nós estamos vendo que o meio ambiente é utilizado como moeda de troca para os municípios. Como o Estado, muitas vezes, não tem condições de dar recurso para as cidades ele permite, facilita essa habilitação para o licenciamento ambiental local. Como por exemplo os loteamentos. Mas na verdade, tanto o Estado não tem condições devido à falta de profissionais, como o município. O que verificamos é que os municípios estão terceirizando através de empresas que fazem o estudo de impacto local e depois a licença é dada.

O que deveria ser prioridade da Sema a fim de montar uma política ambiental para o RS? Para ter uma gestão qualificada, os técnicos têm que serem valorizados. Inclusive aqueles que têm muitos anos de carreira. Conheço alguns destes técnicos que hoje estão na "geladeira" por fazerem um bom trabalho. Fazer um bom trabalho dentro desta lógica imediatista não serve. Teria que fazer concurso para as áreas desfalcadas, atuar com o Ministério Público e fazer um planejamento a médio e longo prazo que incorpore a biodiversidade como elemento estratégico para o desenvolvimento. Na Metade Sul, por exemplo, a pecuária aliada com o turismo rural e árvores frutíferas poderia ajudar no desenvolvimento, desde que tivéssemos discussão com o povo local. A estratégia é reforçar a Sema e seus órgãos, com concurso público e melhoria salarial, ao mesmo tempo em que se discute desenvolvimento. O que se faz hoje no estado está muito longe disso.

Autora: Raquel Casiraghi, Agência Chasque - EcoAgência
Postado por Wilson Junior Weschenfelder


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